11/03/09

Crónicas do Barroso

"Pertenço a uma família de caçadores inveterados. Eu não cheguei a viciar-me porque sou pitosga de nascença e só comecei a usar óculos aos vinte e tal anos. Suponho que foi por isso. Ou não seria. O certo é que, quando de férias, uma vez por outra, pegava na espingarda e saía para o monte.
O meu pretexto era esticar as pernas. Minha mãe e irmãs, no entanto, partiam do principio de que, se eu ia à caça, tinha obrigação de trazer coelho, perdiz ou lebre para arroz. Neste pressuposto, se a sorte me favorecia, quer dizer, se os cães agarrassem qualquer coisa para eu pôr à cinta, elas recebiam-nos de sorriso aberto e mesa posta. Se não, corriam os cães da cozinha a pontapés, como a dizer-me:
- Era o que tu merecias...
Também hoje merecia pontapés. Saí de casa à cata de assunto para este prolegómeno e trouxe apenas um braçado de flores silvestres. É à volta delas que vou circunvagar.
... Já trazia um ramalhete de dedaleiras. Juntei-lhe outro de mentrastos e fui andando...
... Colhi um ramo de flores de sabugueiro e fui andando...Em breve as flores eram mais do que os meus braços podiam abarcar. Retrocedi.
Em sentido oposto vinham duas jovens de palhinha, biquini e sandálias...
Elas continuaram a descer em direcção ao rio e eu fiquei a observá-las pelas costas.
Decerto convencida que eu havia continuado, uma delas fez o seguinte comentário:
- O homem parece uma jarra de flores.
- O que ele parece é um jarreta - acrescentou a outra." (in op, O Jarreta, pgs 211 -213)

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