19/10/09

De marcha à ré para São Paulo

Dia a dia em São Paulo (Foto retirada da net)

Quando o viajante parte, leva algumas ideias feitas sobre o que vai encontrar. Ele sabe aquilo que a maioria contou, os sítios que deve visitar, os locais que não deve ver, a segurança que deve ser integrada na insegurança do que, na verdade, não tem ideia. Sendo, nós portugueses, uns aventureiros dos mares não entendo porque ficamos uns totós em terra desconhecida e neste caso irmã. E sendo os nossos conterrâneos quem mais teme sair de casa, percorrer ruas e que nos tenta demover das visitas programadas pela nossa imaginação e curiosidade, o caso ainda se torna mais sinistro. Se fosse para ficarmos enfiados num shopping ou num hotel, bastava ficar em casa e correr o mundo pela Internet. Salazar gabava-se de o conhecer pelo que lhe contavam e sem sair da sua redoma. Não conhecia, porém, o mais importante da identificação dos povos e que se traduz pelo cheiro da massa humana!
Aterrar em São Paulo e fazer a primeira paragem numa Cervejaria Paulista fez o primeiro impacto. Para meu encanto, a esplanada estava cheia de jovens que na maior das tranquilidades namoravam, riam e mantinham as bolsas a curta distância sem paranóia de roubo. Passear na Paulista, numa noite que estava particularmente amena foi uma simpatia da cidade que me pregaria uma rasteira dois ou três dias depois com a chuva tradicional e o frio a desoras. Um dos traumas da cidade, é tal como em Londres, o tempo. O tempo anda para a frente e para trás entre aquilo que é apenas reconhecido por duas estações. Uma mais quente e outra mais fria, com as mesmas características: com mais ou menos frio e mais ou menos chuva, eis o clima de São Paulo. Talvez por isso, se trabalhe tanto, se crie de forma sôfrega e se passe tanto tempo a inventar tempo. Tempo para o engarrafamento diário, tempo para o almoço de negócio, tempo para experimentar os espaços temáticos e as verdadeiras jóias de conceitos gastronómicos.
São Paulo, fundada pelos portugueses Manuel da Nóbrega e José Anchieta, está ao nível de muitas cidades americanas e europeias e não fica atrás de Nova Iorque ou Londres no que respeita à arquitectura moderna, às livrarias, ao design conceptual das lojas e galerias, à apresentação de conceitos de arte, ao teatro, aos meios de transporte dentro da cidade. O metro, apesar de ter de crescer para as zonas adjacentes à cidade funciona muito bem nos principais pontos daquele centro, em que os carros circulam a passo de caracol. Uma cidade que apresenta tudo o que uma pessoa de gosto refinado pode querer e com as alternativas mais populares para todos os gostos. Segurança a começar pelo facto das favelas estarem mais confinadas que no Rio de Janeiro e que apesar de fazerem parte da cidade, se podem atravessar de carro sem medo ou com a precaução óbvia de todos os lugares do mundo menos recomendados. A violência em São Paulo existe como em Londres, Nova Iorque, Lisboa ou Madrid, só que em dimensões desajustadas da nossa realidade e até da nossa capacidade de percepção e que, a não ser por necessidade ou trabalho ninguém procura, para passear e convidar o assalto. Se durante o dia a cidade é muito airosa, achei-a escura e pouco iluminada à noite.

Edifício Itália ( foto de Filipe Mostarda)

Do alto do Edíficio Itália podemos observar o crescimento de uma metrópole onde tudo é recente e desperta o entusiasmo de quem tem poucos anos de edificação. No Metro, debaixo do asfalto a azáfama de quem trabalha, vive e habita a cidade desde o tempo da sua independência e construção. Ao contrário da lentidão do trânsito a rapidez das reuniões de trabalho demonstra uma cidade que não pára e profissionais que não têm tempo para ficar pasmados. Esta é uma cidade que mexe connosco, com as empresas, com o desenvolvimento e a criação de riqueza num país ainda cheio de contrastes.

7 comentários:

Mike disse...

Descreveu-a como eu não seria capaz, GJ. Essa é, sem dúvida, a São Paulo que guardo no coração. Essa imensa metrópole que, de acordo com o meu pai, foi fundada por esse jesuíta bandeirante que faz parte dos meus antepassados. Bela crónica! Rendida? :D

Ricardo António Alves disse...

Muito sugestivo, GJ. Aguardo a continuação.

Anónimo disse...

Depois do que escrevi num post anterior a respeito de S. Paulo, sinto-me arrependido. Quase envergonhado. A sus descição, fez-me ter vontade de lá voltar e desfazer a ideia ( não quanto á segurança. porque isso sempre me pareceu masi medo de tuga do que outra coisa) pouco abonatória com que fiquei da cidade.

mike disse...

Carlos, olhe que a GJ descreve São Paulo com uma mestria sedutora... mas sim, vale a pena uma outra visita. :)

JdB disse...

Gostei da sua descrição, porque regressei há pouco de uma curtíssima estada de uma semana em S. Paulo. Tal como tenho dito, a cidade merece uma visita de um mês, mais do que de três dias, que foi o que tive para passear à vontade.
Achei uma cidade feia, mas com uma oferta cultural e gastronómica assinaláveis.
Boa continuação, como se costuma dizer.

Luísa A. disse...

Sim, GJ, este seu texto transforma o que sempre ouvi descrever como uma cidade menos bonita numa metrópole cheia de encantos e seduções. As fotografias sugerem-me Nova Iorque no seu melhor. Se sempre me aventurar aos JO-2016 como tenho planeado, talvez aí dê uma saltada. ;-)

fugidia disse...

E eu, a salivar de inveja, ainda inundo a caixinha de comentários...
(o pirata diz-me que eu não ia gostar de São Paulo, porque não teria a liberdade de andarilhar como gosto, mas já não sei não :-D)