16/12/09

Antes ex-fumadora que assim assim

(Foto da net)
É verdade que um ex-fumador se torna um chato para o fumador. Ele passa o tempo a refilar com o fumo do outro, não quer janelas e portas abertas, detesta o cheiro que o fumador lhe trás para casa e entra no carro com o nariz no ar sempre que a mais pequena beata lhe aparece no cinzeiro. Claro que o fumador também se queixa cada vez que o ex-fumador torce o nariz ao seu hábito, fica pior que estragado quando alguém lhe chama à atenção para o mal que o tabaco faz à saúde, apresenta logo as estatísticas do cancro do pulmão versus morte por acidentes de automóvel para além das mil e uma razões para justificar o prazer de fumar. Vem isto a propósito do post da Austeriana, pessoa muito sensata que diz o que pensa e que "se passou" com o moralismo dos não fumadores e seus direitos. Por isso o fumador ao ter igualmente os seus direitos não deveria sentir-se a mais nos lugares que escolhe para fumar. Acontece, que para um não fumador o fumo e o cheiro do tabaco são sempre intrusos que prejudicam a saúde e o ambiente. Para o fumador, que conseguiu o feito de ser ex-fumador a questão tem um valor acrescido. Ele, agora que já passou pelos mesmos males do fumador, que passou o ultraje de se sentir a mais, está em posição de se vingar de todos aqueles anos em que fumou com grande prazer e, também, daqueles que passou a detestar as pessoas com cheiro a tabaco e, igualmente, aquelas que lhe atiram com o fumo a toda a hora. E como os fumadores representam uma minoria, a maioria faz aquilo que todas as maiorias conseguem: fazer sentir mal e a mais quem é diferente! O moral da história é que estes dois grupos raramente se entendem, mas acaba por prevalecer a vontade da maioria seja nos espaços públicos ou privados. Na época, em que eu fumadora tinha de vir para o corredor de serviço, sentia que não valia a pena "ouvir os olhos" que me deitavam os que por mim passavam. Vivia nessa época no Canadá, não foi por isso que deixei de fumar. Não era o corredor, os olhares e a reprovação que me incomodavam, era sim a falta de prazer e o não poder fumar e trabalhar ao mesmo tempo. Fumar tem um ritual, ninguém fuma por fumar, excepto à noite quando já devia estar a dormir e vai fumar mais um cigarro antes de se deitar. O prazer de fumar e o cheiro do tabaco na pele e na roupa fazem parte dos sentidos e não é fácil desviar o sentido do prazer. Deixar de fumar para um fumador é um pecado que comparado com a virtude não compensa, tal como deixar de fumar para o ex-fumador é um pecado a menos que passa a ter. A relação custo-benefício é maior para o primeiro que para o segundo. Assim o primeiro continua o seu prazer o segundo deixa-o cair porque o considera vicio. Do ponto de vista económico há mais pessoas para quem a relação anterior se verifica um benefício qualquer. Pode ser de saúde, cívico, ambiental, moral ou qualquer outro que se entenda. Por isso, está igualmente relacionado com a liberdade de contrariar o que nos ensinaram a escolher ser: anjo ou diabo. Céu, inferno ou purgatório. Poucos serão os que querem ser toda a vida apenas uma coisa daí, haver fumadores, ex-fumadores e aqueles que ficaram assim-assim. Por mim prefiro, apesar de tudo, ser ex-fumadora que assim-assim.

5 comentários:

Luísa A. disse...

Nunca fui fumadora, GJ, mas nunca me incomodou que fumassem ao pé de mim. Ainda hoje não incomoda, talvez porque não tenho olfacto. Isto para dizer que nunca me meto, nem faço reparos a quem fuma. Mas ultimamente tem-me custado esse silêncio, porque uma grande amiga, da minha idade, fumadora inveterada, apanhou uma coisa grave num pulmão, foi operada, vive em risco de recidiva, mas continua a fumar como se nada fosse. Quando as situações ultrapassam um certo nível de insensatez, é difícil virar a cara e olhar para o outro lado. Mesmo sabendo que cada um tem o direito de ser feliz como e o tempo que quiser.

Anónimo disse...

Tem toda a razão GJ, mas eu fiquei-me pelo assim-assim. Uma cigarrilha após as refeições e às vezes uma terceira, quando a noite se prolonga até alta madrugada.
Conforto-meo-me com a ideia de que deixei de ser fumador, (fumava 30 cigarros por dia) mas sei que é uma ilusão.

Ricardo António Alves disse...

Estou a lê-la, fumando, deliciadamente, GJ :|

A disse...

Também eu li com interesse o seu post «fumando um cigarro pensativo».:)))

Agora mais a sério: a publicação do post no «B-c» teve mais que ver com a irritação que me causou o facto de alguém que não me conhece de lado algum ter a ousadia de atirar palpites sobre o meu cigarro, do que com o tabaco. Estou convencida de que, se a moda proibitiva fosse outra qualquer, o «zelador do bem alheio» voltaria a atacar...
Quanto ao vício do tabaco, confesso que me tornei uma fumadora com consciência pesada e essa foi uma das razões que me levou a tentar deixar de fumar. Neste momento, estou na fase que se costuma designar como a da "dose para grávidas", ou seja, no máximo oito cigarros por dia. Acrescento que esses 8 cigarros me deliciam e já percebi que vai ser bem difícil começar a reduzir...
Um abraço e felicito-a por ter conseguido abandonar o tabaco.

Mike disse...

Gostei deste post, GJ. Eu um fumador. Fumador? um heavy smoker, sem orgulho de o ser. :/