25/03/10

Filhos irritados

Com a entrada das noras redobra-se o aconchego das filhas. Com a chegada dos netos apertam-se os laços entre mãe e filha, enquanto os filhos homens ficam no lugar de sempre e não há parceira ou rebento que os substitua. Por muito que se faça, os lugares estão ocupados desde o dia em que nasceram. Para uma mãe os lugares de todos os seus filhos ficam marcados para a vida. A casa da mãe é o lugar onde todos deveriam sentir um porto de abrigo. Infelizmente alguns sentem que têm de ocupar cedo demais o que não lhes pertence. São famílias cujos filhos entendem o poder parental como um alvo a destruir e utilizam muitas vezes o bullying para o conseguir. Nos últimos tempos, tenho assistido a esta barbaridade. Pais que obedecem aos filhos com medo de serem abandonados. Nas fileiras dos hospitais, com os mais velhos debilitados e frágeis é vulgar ver a irritação dos filhos face ao familiar doente. A forma como falam e se dirigem a quem está doente e acima de tudo é pai ou mãe, é um verdadeiro murro no estômago para quem observa. Pena que não o seja, também, para quem o dá. A situação socioeconómica provoca muitos estragos, mas nada que se compare à falta de amor e de amizade entre pais e filhos.

14 comentários:

Luísa A. disse...

Minha querida GJ, permita-me que lhe diga que nem tudo o que parece, é. Estava a ler o seu «post» e impressionou-me imediatamente a descrição dessas manifestações de irritação filial com pais debilitados. São chocantes, e é importante que se saibam controlar. Mas – falo-lhe por experiência própria – há pais que dão conta da paciência a um santo. Não, evidentemente, porque se encontrem debilitados, mas porque a idade os faz, frequentemente, teimosos, caprichosos, detentores de todas as verdades e únicos verdadeiramente sabedores da natureza dos seus males e das respectivas curas. Dou-lhe este exemplo, ligeiro, mas que indicia bem a atitude de que falo. Queixa-se a minha Mãe de que anda a dormir mal de noite. Sugiro-lhe eu que deixe de dormir de dia, porque quem dorme de dia há-de, naturalmente, dormir mal de noite. Responde-me a minha Mãe que o melhor é acabarmos rapidamente com «esta conversa que não leva a lado nenhum». Fico eu a remoer-me por ter dado azo a semelhante conversa, que devia ter previsto que «não levaria a lado nenhum». Isto acontece dez ou vinte vezes em cada telefonema, porque as queixas são múltiplas, parecendo requerer respostas. Mas não. A minha Mãe só quer falar, só quer fazer o que muito bem lhe apetece… e só quer que eu a oiça. Ingrato papel de uma filha que, na verdade, começa a interessar-se e a preocupar-se menos do que devia… :-S

Luísa A. disse...

Querida GJ, tenha o meu comentário anterior em conta de desabafo. Hoje já vou ouvir a minha Mãe como devo: num silêncio muito paciente, apenas pontuado de prestimosos murmúrios de assentimento. ;-D

Mike disse...

GJ, não me leve a mal, mas devo confessar-lhe que não sei que texto gostei mais. Se o dos "filhos irritados", se o da "filha ouvinte por vezes impaciente mas que hoje ouviu pacientemente".

Do "filhos irritados" gostei particulamente da lucidez e pragamatismo do último parágrafo, ao fazer uma associação à situação e ao amor e à mizade entre pais e filhos. E só por isso, termino o meu comentário reforçando um desejo muito meu e já manifestado aos filhos mais velhos: quero (e espero poder) ir para um bom lar, quando o momento chegar.

Sobre o "filha ouvinte e tal e coisa" (risos) direi à autora do mesmo que oiça, oiça muito, mas que fale, fale também... evitando respostas que não levem a conversa a lado nenhum. ;-D

(Não vou rever o comentário, que deve ter erros a mais).

Bacouca disse...

GJ
Eu concordo consigo e na verdade é outra forma de bullying. A mim também me choca imenso mas julgo que esse tratamento vem de filhos que entretanto tem a sua formação académica mas cujos pais poucos estudos tiveram. Actuam por má formação, por se acharem superiores, e talvez porque em crianças não receberam o amor e carinho que necessitavam.
Claro que não há desculpa, mas a sociedade deveria estar preparada para colmatar esse drama com apoio domiciliário, com lares humanizados, etc.
Um beijo

Bacouca disse...

GJ
Com o caraças, como escrevo logo o meu comentário e só depois, eventualmente, possa ler um ou outro, espero que a Luisa, não me leve a mal mas eu referia-me aqueles filhos ou filhas que sao, por natureza, duros com os pais.
Claro que conheço pais que por vezes fazem perder a paciência, mas noto que são aqueles que não se ocupam e mesmo ocupando-se têm momentos de solidão e fazem "cenas" para chamar a atenção, para pedir um carinho. Enfrentar a velhice, a doença ou a invalidez, no mundo que agora vivemos não é fácil!

fugidia disse...

Posso comentar o post, o comentário da Luísa e do Mike? ;-)

Sim, GJ, é verdade o que diz mas temos mesmo de distinguir os filhos que amam verdadeiramente e estão impacientes dos que não têm (alguma vez tiveram) respeito e amor pelos pais.
E dou-lhe o meu exemplo. Com o meu pai procurei sempre ser muito paciente quando ele entrou na fase do discurso em círculo. Quando a minha mãe foi operada ao coração e estivémos os dois juntos na sala de espera do hospital cerca de cinco ou seis horas ele perguntou-me sem cessar, com intervalos de um ou dois minutos, o que estávamos ali a fazer e quando eu lhe explicava, revelava espanto e logo a seguir perguntava-me quando ia jantar e quem lhe daria de jantar. Cinco/seis horas assim. Respondi-lhe sempre, com um sorriso, pacientemente. Vi a minha irmã mais nova, por diversas vezes, a responder mais rispidamente ao meu pai, noutras alturas e, apesar disso me ter impressionado algumas vezes, compreendi-a.
No que diz respeito à minha mãe, mea culpa, sou eu que sou muito mais impaciente com ela do que a minha irmã. Talvez porque vejo-a ainda lúcida e porque temos personalidades muito diferentes e sempre revelámos mais dificuldades de encaixe, sem prejuízo do amor que lhe tenho e sei bem que ela me tem.
(e escrevo isto sabendo bem que ela há-de ler... ;-) )

Luísa, compreendo-a :-)

Mister, e no lar, há quartos duplos? ;-D

Mike disse...

Tem que haver, Fugidia. É condição sine qua non! ;-)

Anónimo disse...

Aproveitando a deixa...

Concordo plenamente com a fugidia quando diz que tem de ser feita a distinção entre quem ama e se impacienta e quem não ama/respeita.

Obviamente que não há desculpa para quem se dirige ao seu(s) progenitor(es) de forma chocante sem qualquer preocupação pelo seu bem-estar ou necessidades. Também me choca. Mas também sei que muitas vezes (como disse a Luísa) nem tudo o que parece é.

A paciência é uma virtude e haverá alturas em que conseguiremos tê-la mais do que noutras. E por vezes somos ríspidos e poderemos ser incompreendidos quando observados pelos outros. Mas não significa necessáriamente bullying, falta de amor ou de amizade. Significa apenas que talvez já tenhamos passado por aquela situação vezes sem conta e as circunstâncias/problemas/situações daquele dia específico nos levem a ser impacientes ou a estar irritadiços.

O que não invalida que aconteçam (e cada vez mais infelizmente) situações como a CJ descreve e que eu própria tenho assistido.

Um bom fim-de-semana =)

Anónimo disse...

"CJ" é "GJ" obviamente
=)

ana v. disse...

Meus queridos amigos, acho que todos têm razão. Eu própria fui várias vezes impaciente com os meus pais, embora adorasse ambos. Mas não quando ficaram doentes. E muito menos numa situação de extrema fragilidade e medo, como é o estado de espírito de quem está em tratamento oncológico. Nesse caso, toda a rispidez é imperdoável. E é desse caso que fala a GJ, que o presenciou in loco (e eu também algumas vezes, infelizmente).

Bjs, GJ e todos

Teresa Santos disse...

GJ, o que descreve é um verdadeiro drama, não havendo para mim, qualquer razão que o justifique. Há anos atrás estive hospitalizada durante uns meses e lembro-me, ainda hoje, de idosos que eram literalmente abandonados no hospital, porque os filhos, simplesmente, desapareciam dando moradas falsas. Haverá maior drama? Haverá maior tragédia para alguém em final de vida? Haverá desculpa para esta atitude? Os meus Pais já partiram, mas orgulho-me de os ter acompanhado até ao fim. A minha relação com a minha Mãe sempre foi mais problemática mas, quando adoeceu - e a doença foi prolongada - esse aspecto esfumou-se. Meu Deus, era a minha mãe que estava ali, doente, frágil, a precisar da minha mão, da minha ajuda.
O meu Pai, como a Mãe minha partiu mais cedo, quando adoeceu veio para minha casa e, teve o seu carinho, o seu conforto até ao fim. Por vezes, não sabia muito bem onde estava, mas SABIA que a filha estava ali. Porque perguntam a mesma coisa N vezes? Porque não aceitam o que se lhes diz? Pois é! É que mesmo idosos, doentes, continuam a ser gente! Gente que tem direito a ter vontade própria, gente que precisa de ser ouvida. Será que alguém (os filhos, obviamente!)se lembra disto? Será que não se apercebem da Solidão, do vazio que muitos sentem?!
E não, garanto-vos que não sou boazinha!...

Lina Arroja (GJ) disse...

Amigos, agradeço os vossos comentários. Foram todos importantes e estou de acordo com muitos. Claro, que sorri com a Luísa e compreendo a falta de paciência e logo a seguir o arrependimento. Eu fiz o mesmo com os meus pais.
Li todos com muita atenção e registei com agrado a visita da Luar.
Deixo-vos um abraço amigo.:-)

Luísa A. disse...

Obrigada pela sua compreensão, GJ. Mas o que queria mesmo era desejar-lhe uma boa Páscoa. Um beijo. :-)

Lina Arroja (GJ) disse...

Páscoa Feliz, Luísa. Beijo :-)