18/03/10

Um luxo do passado

A TAP iniciou há umas semanas uma campanha sobre promoções e destinos. A ideia é incentivar a compra de viagens com antecedência, favorecendo o cliente e abrangendo aqueles que fazem compras online. Para além disso, conta com a participação dos seus fiéis utilizadores incentivando a utilização de milhas acumuladas e outros benefícios a elas associados. Na rádio oferece até meia hora de música. Tirando um ou outro ponto, a campanha publicitária parecia correr bem e até poderia desviar alguns das companhias low-cost. Quem viaja com frequência sabe que entre uma companhia low-cost e a nossa empresa nacional, a escolha dos portugueses recairá sobre a segunda se a diferença de preço não for significativa. A ideia de poder usar o porão de bagagens sem preço acrescido, do espaço entre os assentos ser mais confortável, do jornal e da revista juntamente com o café ou laranjada serem elementos de conforto, para não falar do orgulho que todo o português tem, e com razão, na sua companhia aérea, favorecem a escolha.
Acontece que a campanha não poderia ter saído na pior altura para o orgulho nacional. Não que os clientes tenham alguma coisa a ver com isso, mas porque a companhia há muito que deixou de ter quem vista a camisola. Há muito que a Air Portugal deixou de ser a TAP e de pertencer apenas a quem lá trabalha para pertencer ao país. Há muito que deixou de ter a marca da companhia, apesar de continuar a ser portuguesa. Há muito que deixou de ser o bom nome da pátria. Há muito que deixou de ser apenas Portugal.
Hoje a TAP é uma empresa portuguesa, sim, estatal também, paga pelos contribuintes que nela viajam incluindo quem nela trabalha, mas falida. Por isso, os luxos são outros. No passado, quem nela trabalhava passava uma imagem, de orgulho, de exclusividade, de saber estar, de profissionalismo, de competência. E não seriam os salários o único vector que determinava a escolha da empresa para trabalhar, mas sim e também o glamour associado à escolha daquela empresa para trabalhar. Isto fazia a diferença. As jovens da minha geração teriam todas optado pela carreira de hospedeira, caso tivessem altura, falassem os idiomas e a família estivesse desatenta. Para além do mundo e das viagens era também a farda da companhia e a admiração que provocava. E os jovens, quem não admirava aquele pessoal de bordo alinhado com a seus galões? Com o tempo, passou a ser sinal de arrogância também.
Na época em que andar de avião era um luxo, o pessoal de bordo ou de terra também eram a condizer. Os passageiros eram privilegiados. Podiam não ter ainda o estatuto de clientes mas eram tidos como tal. Hoje, a TAP - Air Portugal membro da Star Alliance é mais uma companhia que voa e os seus pilotos vêem-se não como trabalhadores a servir os desejos dos seus clientes, mas como meninos bonitos que, pela sua suposta diferença de estatuto, gostam de andar up in the air. Para bem de todos, deve ser exactamente isso que vai acontecer um dia destes, ou voam sozinhos ou ficam em terra a encher as fileiras do desemprego.
A empresa, será gerida por capitais privados alheios, levanta se tiver lucro e aí, serão os vencimentos que puderem ser pagos e os aumentos que a administração ditar que vigorarão. Em relação às campanhas, essas serão feitas conforme o que ditar a casa-mãe, que poderá estar em qualquer ponto do globo. E os clientes, aqueles que online consideraram apenas o custo e o benefício da viagem. Não serão de luxo, mas passarão a ser um luxo para uma companhia endividada e a necessitar de reforma urgente.

4 comentários:

Anónimo disse...

Sou fã da TAP e considero ignominiosa a greve que vão fazer na Páscoa.

Luísa A. disse...

GJ, não posso estar mais de acordo consigo. A TAP era, há uns anos, um motivo de orgulho nacional, não só pelo serviço que prestava a bordo, como pela formação que vendia a muitas companhias aéreas estrangeiras, sobre segurança e questões relacionadas. Era uma empresa de referência no mundo aeronáutico. Hoje, não sei se dá formação - talvez a alguma companhia dos PALOP - e o serviço a bordo é execrável, muito ao estilo «low-cost». No próprio capítulo da segurança, já não tenho a confiança cega que sempre tive, pelo que se sabe das horas de voo dos pilotos, pelo que receio em cortes no pessoal da manutenção, etc., etc., etc. Desagrada-me que, neste tipo de «transportes colectivos», se entre com considerações de rentabilidade, porque a concorrência dos preços só pode ter como efeito, numa empresa com os «hábitos» da TAP, uma progressiva perda de qualidade, até à perda de viabilidade. Mas haverá alternativa? Só espero que, um dia destes, não demos por que os nossos (já escassos) aviões também começaram a cair.

Dreamer disse...

Faço minhas as palavras da Luisa

Lina Arroja (GJ) disse...

Esta grve não tem palavras e o pior é que o pessoal de terra também discorda. Uma empresa onde andam às turras...