04/07/10

Todos iguais

A Fernanda acabou o tratamento, a Augusta tem mais uns dias, a Filomena diz-nos adeus na quarta. Eu acabei a terceira semana de radioterapia, faltam outras tantas. O ar do IPO é mais pesado que o dos corredores do Hospital de Sto António, as pessoas estão quase todas a fazer e a pensar o mesmo. A comunidade de utentes passa horas à espera "do tratamento", ouvem-se risos misturados com relatos pessoais e indignações de vez em quando. É também um local de estacionamento dos familiares que acompanham quem vem de longe. As SCUTS são tema de conversa, o preço dos bens alimentares e a sardinha que alguém tem de assar quando acabar o tratamento desse dia, também. Repetidamente, Fernanda, Celeste, Augusta, António, "ao tratamento". De vez em quando, Joaquina, sala de tratamento 1. Cinco dias na semana e pelo menos duas a três horas passadas na sala de espera. O ar é pesado, as histórias vão passando e a esperança renova-se até ao dia seguinte. Nota-se, no entanto, uma certa segmentação de grupos. Os grupos dividem-se por áreas geográficas. Eu gosto de me sentar junto do grupo de Paços de Ferreira, pelo caminho vou sabendo que um dos maridos é serralheiro, outro carpinteiro, um é irmão e primo de outro acolá e as mulheres com a pele tisnada pelo sol, e sem rugas, falam dos filhos adolescentes ou universitários. É bom saber, que apesar da ruralidade os jovens querem seguir outros caminhos e têm pais para os incentivar. É reconfortante perceber que apesar de tudo somos todos iguais. "Que idade você tem? pergunta-me a Fernanda. "Olhe, que está bem conservada!". Todos iguais, com mais ou menos make-up!

5 comentários:

Luísa A. disse...

Os hospitais proporcionam-nos, de facto, a visão de outras dimensões da nossa condição humana, GJ. Só eles me dão a noção de como vivo fechada numa redoma. :-)

Si disse...

Estou completamente de acordo consigo e com a Luísa, GJ.
Pena é que muitos profissionais de saúde sejam os primeiros a estabelecer a diferença, ou melhor, a indiferença...

Bacouca disse...

Gj
Concordo em pleno com a Luisa e com a Si.
Se mandasse pediria ás pessoas que passassem um dia de voluntariado num hospital. Sendo normalmente um local triste compartilhamos experiências, apoios, que nos une seja o Sr. ou a Sra. com "de" ou sem " de". Infelizmente há médicos e enfermeiros que distinguem isso tão bem e por vezes de uma forma gritante. Agora que somos lá todos iguais somos! Estamos lá pela falta de algo tão importante da vida: a saúde.
Beijo

Mike disse...

Eu acho que também me sentaria no grupo de Paços de Ferreira. Excelente texto, GJ. Excelente!

ana v. disse...

O IPO é um microcosmos curiosíssimo e uma grande lição de vida. Realmente, ali todos somos iguais e essa sensação é boa, ao contrário do que possa parecer. Só conheço outro fenómeno que produza o mesmo efeito: o futebol.