29/01/21

A brincar com o mistério e à laia de policial

Uns amigos haviam mencionado aquele Hotel num lugar maravilhoso e há muito colocado no plano de viagens a fazer um dia. Partiram  no Porsche e foram fazendo os quilómetros sem pressa. Parando a cada 200km, umas vezes para descansar, beber um refresco, comer uns pistachios, outras para aqui e ali descobrirem  os Hoteis de Charme da região.

Em Espanha, Sevilha foi a cidade escolhida pelo Flamenco, pelas Sevilhanas e pela própria Andaluzia.  Sentaram-se num lugar central para degustar as  tapas que acompanhavam um  Rioja branco, enquanto sentiam o vibrar do Bairro de Santa Cruz. Fizeram o clássico passeio dos amantes em, charrette ao entardecer. Naquela época do ano a temperatura era amena, 28º Celsius, uma benção divina. Subiram Las Setas, aquela out of the box estrutura arquitectónica  sevilhana. Tiraram fotografias ao pôr do sol, ainda lhes sobrando tempo para o passeio  no rio Guadalquivir.

Seguiram viagem atravessando os vinhedos e as planícies francesas, não deixando de visitar os Castelos de Loire. Experimentaram a cuisine française ses vins et sa patisserie, passaram pelas charmosas aldeias da Bretanha. Em Paris visitaram no Louvre a Exposição  Leonardo Da Vinci, e entraram em Itália. Desta vez, queriam chegar a Milão a tempo do concerto de Andrea Bocelli. Ficariam três dias, com os amigos italianos que lhes tinham aconselhado o Hotel Pasolini.

Em apoteose entrou o Porsche e seus ocupantes na verdejante propriedade. O edifício deixava adivinhar o interior e a perspectiva da paisagem sobre o lago não os deixaria serenar. O quarto virado ao lago era majestoso, próprio para qualquer membro da realeza ou de viajantes requintados. Decidiram jantar nessa noite  no Hotel e apreciar todo o esplendor do interior, que iluminado por uma luz ténue, mantinha a ilusão de séculos passados.

Finda a refeição recolheram ao quarto. No dia seguinte, o pequeno almoço seria  tomado  na varanda apreciando a beleza das águas do Lago Como. O luar iluminava o quarto, da varanda  escutavam-se os sopros e as nuances da corrente.  Olharam-se  não necessitando de palavras.

O grito chegou com o estalido abafado dum revólver, um, dois, três tiros foram disparados. Os quartos tinham sido insonorizados no ano anterior para salvaguardar o repouso dos hóspedes.

O Hotel Pasolini tem apenas três pisos e uma trintena de quartos no total,   todos têm varanda. O camareiro tocou à porta do quarto 13 do andar superior, trazia um carrinho de chá com o pequeno almoço completo para duas pessoas. Do interior chegou um sumido “entre”. No quarto, virado de pernas para o ar, havia um vulto que lhe pareceu ser de uma mulher.

A figura não era parte do casal, esse pormenor ele não sabia e já tinha levado o pequeno almoço a muitos quartos de hotel ao longo dos anos. Contudo, algo lhe pareceu suspeito naquela desarrumação. Deixando o carrinho de chá, fechou a porta e   comentou com os colegas da recepção que algo de estranho se deveria ter passado no andar de cima. Os outros encolheram os ombros e recomendaram-lhe que não se metesse na vida dos hóspedes, mas que ainda assim iriam verificar a saída do 13, o que, na realidade, nunca aconteceu.

No hotel instalou-se a dúvida perante aquele sinal de Don’t Disturb na porta e com determinação entraram no quarto. O director ficou perturbado com o que viu, parecia um assalto, as roupas rasgadas e espalhadas pelo soalho e a cama sem alguém lá se ter deitado.  Claro que, também, não viu o vulto de mulher que abrira a porta ao camareiro, nem o carrinho de chá e muito menos haveria de ver o Porsche no exterior da propriedade. Continuando as buscas, o carrinho de chá foi encontrado no jardim sem pequeno almoço, a mulher misteriosa concluíram que poderia ter sido uma ilusão do camareiro que a julgou ver e ouvir.

Do casal ou do Porsche  ninguém mais ouviu falar ficando a investigação em aberto até hoje. Na região ficou a dúvida se teria sido assassinato sem  prova ou fuga. Há também aqueles que dizem que os hóspedes não tinham cartão de crédito para a avultada despesa a pagar.

Alguns acreditam que foram levados pelas águas do Lago Como nalgum canto de sereia, enquanto outros garantem que estão numa ilha de actores americanos encenando o seu desaparecimento com identidade falsa e desconhecida. 

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