Passado o momento da aceitação e da luta contra o mal, surge a necessidade de viver a doença em liberdade. E porque tudo o que é postiço cansa, a peruca torna-se um fardo que apesar de nos por bonitinhas e capazes de enganar qualquer um, só nos apetece atirar ao mar ou ao rio mais próximo. Daí que, a liberdade sentida no meu terraço a deslumbrar o mar, com a brisa matinal a tocar-me o rosto e os raios de sol a acariciar a careca mesmo que por alguns minutos, represente um dos momentos mais deliciosos de liberdade em doença. O cancro é uma doença que não é nem melhor nem pior que outras, tem a maçada de poder ser terminal, mas tirando esse aspecto que também é comum a outras doenças, não é assim tão difícil de lidar. No início a luta é investida com imensa garra, a capacidade de traduzir essa força é um combate e fazer de conta perante os outros é um dos aspectos que nos permite dominar uma situação sem domínio. Com o decorrer dos tratamentos e sessões o nosso dia-a-dia gira em torno dum ciclo. Cada x semanas, no meu caso três, tudo se repete e o cansaço atinge-nos psico e animicamente. E é aí, que a necessidade de viver a doença em paz e liberdade se revela como uma necessidade e também como uma arma para a cura em remissão. O caminho torna-se agora uma estrada em que a opinião dos outros não nos interessa e em que a nossa capacidade de acção se resume àquilo que nos apetece fazer. E este apetecer pode ser apenas olhar o mar ou ficar sentada no terraço com um livro no colo durante uma manhã ou uma tarde. A liberdade é um bem precioso em todos os sentidos e fases da vida e que eu estou, felizmente, a poder viver.
19 comentários:
Permita-me dizer que admiro muito a sua coragem e força de vontade!
Espero que continue a gozar o sol no seu terraço, com ou sem livro no regaço. Carpe diem!
Caraças, Colega, nem sei muito bem o que comentar depois de lido este texto... espere lá que por acaso até sei! Terei que ser honesto e sincero. Aqui vai: entre a admiração pela pessoa e o texto sereno e bem escrito que ia lendo, não evitei pensar "graças a Deus, a GJ pode viver a liberdade na doença". E lá ia eu, continuando a ler até chegar ao fim e... Bang!
"A liberdade é um bem precioso em todos os sentidos e fases da vida e que eu estou, felizmente, a poder viver". Mas quem sou eu para achar o que quer que seja face ao contexto? Um abraço. :-)
Felizmente que a pode viver sim, e que a sabe valorizar tão bem, acrescento.
Beijo :-)
Querida GJ, é isso mesmo. As máscaras que frequentemente temos de nos colocar para não nos expor perante os outros tornam-se, com o tempo, molestas como prisões. É óptimo que possa gozar longos períodos de intimidade (só consigo ou com os seus). Porque a intimidade das nossas casas - surpreende-me, às vezes, que tão poucos o sintam – são, sem nenhuma dúvida, o que temos de mais próximo da liberdade. Tudo o resto são condicionamentos, mais ou menos pesados, mas condicionamentos. :-)
GJ
Como eu a percebo! Realmente o seu post tem haver com o meu. No fundo por razões de saúde podemos tirar a "máscara", porque nós próprias a aceitamos e enfrentamos o dia a dia da melhor maneira e por isso com toda a nossa liberdade.
Força e optimismo são tão importantes para vencermos e este seu post mostra bem que isso não lhe falta!
Um beijo
Que melhor testemunho para compreendermos o valor da LIBERDADE?! Qualquer que seja a situção, é o melhor dos bens de que podemos usufruir.
Obrigada pela ajuda na desmistificação de medos, ângustias, que não são apanágio de APENAS uma doença.
Abraço, cara GJ.
Nada mais consigo dizer, que não seja que me deixou sem palavras.
De qualquer maneira, Jóia, estás e estamos vivos, estás connosco, estamos contigo, é verdade que todos havemos de morrer, mas sejas tu, alguma tua amiga, ou algum de nós, ou nosso familiar e amigo, a atravessar a tensão de uma doença, o possível é a cura e cada dia de vida é um instante que adicionamos à eternidade do cosmos de que somos criaturas, mas de que intelectualmente suspeitamos não sermos menos admiráveis do que ele, mesmo que nos tenhamos de render á sua omnipotente natureza.
Um abraço, Jóia.
v.
"(...) tem a maçada de poder ser terminal" é óptimo, GJ! Puro Eça...
Continue assim, com humor, liberdade e sabedoria, e tudoo isso vai passar muito mais depressa. De resto, não é das carecas que eles gostam mais?
Um abraço
:-)
Esplêndido, GJ, um post muito inspirador e também exemplar.
Um abraço.
P.S. Eu já ficara bem disposto ao lê-la, mas, depois de ver o comentário da Ana Vidal, hilariei!
Desmancho-me...
Novo abraço :)
Um depoimento fabuloso Gj!
Não Ana! Não é das carecas que eles gostam mais. É das loiras. (risos)
Sugiro que tente gozar essa traquila liberdade ao som do "dream of the return".
Pode encontrá-lo aqui: http://www.youtube.com/watch?v=SE5Dr8J8Sic
Mas terei muito gosto em lho gravar (com cd completo)se a sonoridade agradar.
Ok, colega. Pelo sim pelo não vou comprar uma peruca loura para o enganar. (risos)
Nuno, podemos incluir na tal playlist ...;)
GJ, quase fiquei sem palavras, com o seu texto. Mas quero encontrar as certas para dizer que a admiro, e que considero o seu texto um dos mais belos que já li.
Um grande abraço :)
Fantástico texto e Linda GJ.
Quando as palavras faltam, um sorriso é o que tenho para oferecer =)
beijinhos e Saúde é o que desejo ao diamante cor-de-rosa da blogosfera!
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