O Sr. Francisco era o funcionário mais novo, tinha a nossa idade, era magro, simpático e pertencia àquela comunidade. Dava-se com todos, parecia um de nós, só que passava o tempo à entrada da porta de vidro, enquanto nós passavamos o tempo em pé ou de um lado para o outro e de vez em quanto íamos às aulas. Várias pessoas tentavam envolvê-lo noutras lutas e actividades. A sua fraqueza, dizia ele, era a matemática e apesar dos esforços ninguém conseguia convencê-lo a fazer outra coisa para além do que já fazia, ou seja, ver quem passava e dar uma palavra a todos. Um dia, um dos professores chamou-o e perguntou-lhe se ele não gostaria de continuar a estudar. A Universidade ajudava e quem sabe ele um dia ali estaria como aluno. O primeiro passo foi arranjar uma secretária e a respectiva cadeira para ele se sentar e estar mais confortável. Continuava no seu lugar e podia até começar a ler algum material que o professor arranjaria e todos nós lhe ensinaríamos. Em 1975 tudo nos parecia possível e nós eramos as forças dialogantes capazes de mudar tudo e todos. Porém, há pessoas e coisas que não nasceram para a mudança e o Sr. Francisco era uma delas. Que não, respondeu ele ao professor em causa, o problema dele era na verdade a matemática, mas acima de tudo havia outra questão pior, é que "Ó xenhôr dótôr, eu já não tenho cabêcha!"
O ponto é que os dois continuam no mesmo sítio. O que já não tinha cabeça continua sentado à secretária a ver quem passa, mais gordo e menos dialogante. E o professor também, se bem que em espaços diferentes. E
matemática passou a ser 2+2=5 , igual à lógica da batata e a maioria de nós "já não tem cabeça"!
6 comentários:
Abençoada matemática para uns e maldita matemática para outros. ;)
Imune a ela (ou não!) continua a lógica da batata que, num 2+2=5, mais parece a lógica da batota. ;D
Pois, é um problema muito complexo que já vem de longe. E fazer as contas não é para qualquer um 6x3=18...e cá estamos outra vez, batata sim, batota não e recomeça tudo de novo. E repete...;)
Ah, eu já não tenho cabeça... (gargalhada)
Compreendo bem que não se goste de Matemática, Grande Jóia. Eu não gostava em miúda, porque a minha professora era terrível (embora muitíssimo sabedora, o seu método de avaliação era arrepiante) e durante anos tive pesadelos com ela. Mas fui sempre boa aluna. Admito que, nalguns casos extremos, não haja realmente cabeça. Mas, em geral, o diagnóstico tem de ser de «preguicite aguda». É frequente ouvir esse argumento – «já não tenho cabeça» - a pessoas mais velhas em relação às novas tecnologias. Mas a verdadeira razão é a indiferença e a mandriice, porque cabeça têm-na – e muito viva – em relação àquilo que lhes interessa. A Matemática é bem o espelho do estado e da atitude do país em relação a tudo o que implique esforço e perseverança.
Luísa, muito bem colocada a questão.
A mandriice é mãe de muita coisa e a falta de perseverança e esforço um dos maiores males do nosso tempo, Portugal incluído.
A comparação de imagens mais acima é exactamente esse. Quanto tempo dura a filosofia do sonho e que nível de esforço é necessário para atingir o objectivo do sonho.
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